terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A sacolinha do fim da rua



Tinha uma moça no fim da rua que sempre passava com uma sacolinha de supermercado. 

Quando o sol se punha, ela saía pra beira da calçada e ficava olhando as estrelas tomarem o céu, pouco a pouco. Talvez naquelas horas, treinasse a sua paciência.
Antes de dormir, horário fértil para as reflexões, ela pensava em como a vida se tornava viva. E isso a enlouquecia.
Ela não achava ruim que seus pais brigassem todas as noites, ela não via mal em suas notas na escola não serem as melhores, ela achava normal que seus amigos a deixassem de lado, ela deixava de lado a maldade.
E quando olhava pela janela, em quase todas as noites, via a luz discreta da lua contagiando seu adormecer e prolongando uma espécie de torpor – protetor – com o qual, ela tinha se acostumado.
No dia seguinte, quando as estrelas já tinham sumido e a lua se escondido, ela se levantava da cama, sem agradecer nem amaldiçoar nada. Ela só vivia, por viver. Afinal, nada a fazia bem, nada a fazia mal. 

Quando chegava na escola e sentava, sua coluna reclamava, afinal só andava inclinada. Apoiava o rosto nos braços e tentava ouvir as palavras dos professores, mas só tentava. Sua atenção estava voltada para uma estória que inventava, todos os dias, naquele horário, imaginava e contava para si mesma, a mesma estória sem fim.
Mas num flash de lucidez, ela ouviu o professor dizer: “As tartarugas pensam que as sacolinhas plásticas são alimento ou as confundem com o reflexo da água e as ingerem, causando a morte por asfixia”.
Então, com os olhos bem arregalados e com o coração tendo um aperto estranho, pensou em quantas tartarugas ela havia matado. Ficou quente, ficou gelada e sentiu sua consciência, há muito tempo perdida, voltando, tomando lugar e fazendo-a sentir. 

                                               [...].

Mas, depois, como se numa briga pela sua alma, a calma passiva tivesse sido vitoriosa, apenas pensou: “Vou levar meus cadernos nos braços, não vou mais pedir sacolinhas pro dono do mercado”.
E, para se dar por satisfeita imaginou quantas tartarugas salvaria, e, ousou pensar e ter uma vontade! Veio lá do coração o desejo de ver uma tartaruga de verdade.

2 comentários:

  1. Gostei muito da estória,´e linda é calma e me fez muito bem. Eu também gostaria de salvar o mundo mas não esse mundo, o meu mundo.

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    1. Olá! Que bom que gostou :)
      Obrigada por contribuir com a impressão que essas palavras tiveram em você. De fato, salvar o mundo é um objetivo nobre. E salvar o seu mundo pessoal já é um grande passo para salvar o mundo de todos nós. O mundo vale a pena!
      Sinta-se sempre bem vinda ou bem vindo, caro comentarista anônimo! E se quiser deixar de ser, é bem fácil! Se inscreva e tenha sempre as novas potagens para ler.

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